Pesquisas analisam efeito neuroprotetor do exercício físico-Ciência&Mulher-Publicação da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência

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Melhora da memória e redução de danos causados por isquemia e pelo envelhecimento estão entre os benefícios da atividade física observados em testes com animais

 

Exercícios físicos em intensidade moderada podem reduzir os danos causados por isquemia cerebral, potencializar a expressão gênica, melhorar a memória e até aumentar a ativação de enzimas que atuam contra a Doença de Alzheimer.  Essas foram algumas das descobertas de pesquisas que investigam o efeito neuroprotetor de atividades físicas em modelos animais, coordenadas pela professora Ionara Siqueira, do Departamento de Farmacologia do Instituto de Ciências Básicas da Saúde da UFRGS (ICBS).

O termo neuroproteção se refere a mecanismos e estratégias usados para proteger os neurônios contra danos decorrentes de enfermidades que afetam o Sistema Nervoso Central, como doenças neurodegenerativas, derrames ou isquemia cerebral. Esta moléstia consiste na falta de irrigação sanguínea e, consequentemente, de oxigênio no cérebro e pode levar à morte neural em áreas relacionadas ao processamento da memória, como o hipocampo e o estriado. A ideia é prevenir a progressão de doenças e de danos secundários, interrompendo, ou ao menos retardando, a morte ou a disfunção dos neurônios. No caso da isquemia, por exemplo, agentes neuroprotetores podem ser utilizados para limitar suas consequências e evitar danos cerebrais irreversíveis.

Os estudos coordenados pela professora Ionara tiveram início em 2006. O grupo, que reúne também pesquisadores do Departamento de Bioquímica, do Departamento de Fisiologia e do Programa de Pós-graduação em Neurociências, teve como objetivo inicial avaliar o efeito de diferentes protocolos de exercícios na redução das injúrias relacionadas à isquemia. Trinta ratos foram divididos em quatro grupos: um foi submetido a exercícios de intensidade moderada, com 20 minutos por dia durante duas semanas; outro, a treinos de alta intensidade, de 60 minutos por dia; os últimos dois não receberam qualquer treinamento.

Os animais foram sacrificados 16 horas após a última sessão de exercícios e tiveram seus hipocampos dissecados e submetidos à privação de oxigênio e glicose, em uma espécie de mimetização do que seria um cérebro afetado por isquemia. A conclusão a que chegaram é que treinos de intensidade moderada são capazes de reduzir os efeitos da isquemia; as atividades de alta intensidade, entretanto, aumentam o dano cerebral. O excesso de exercícios pode aumentar o estresse oxidativo, devido à formação de radicais livres, e deixar o cérebro mais vulnerável aos efeitos da isquemia.

Exercícios e expressão gênica

A partir de então, os pesquisadores passaram a adotar o protocolo padrão de 20 minutos de exercícios para avaliar outros parâmetros relacionados à neuroproteção, como os processos de acetilação e desacetilação de histona. Proteínas encontradas no núcleo das células, as histonas são envoltas pela molécula de DNA, com um papel importante na regulação dos genes. Na acetilação, a estrutura composta por histona e DNA é relaxada e possibilita maiores níveis de transcrição de genes, o que inclui aqueles relacionados à produção de proteínas neuroprotetoras e à ativação do armazenamento de memórias. A desacetilação, por outro lado, torna essa estrutura mais compacta e diminui a expressão gênica.

Os testes com animais apontaram que a atividade física influencia diretamente nesse processo, aumentando a acetilação e diminuindo a desacetilação. “De modo geral, podemos afirmar que o exercício físico desenvolve um ambiente propício para a expressão gênica”, resume Ionara. Os efeitos, entretanto, são transitórios e só são percebidos até uma hora após o fim da atividade.  Segundo a professora, isso acontece como um mecanismo de adaptação do organismo, para evitar produzir mais substâncias que o necessário.

Memória e envelhecimento

Outro dado que chama a atenção se refere à influência dos exercícios na memória e na neuroproteção contra o envelhecimento. Há evidências que mostram o papel da neuroinflamação no processo de envelhecimento cerebral, como o aumento dos níveis de citocinas pró-inflamatórias e a diminuição de citocinas anti-inflamatórias. “O problema é que, para combater a inflamação em desenvolvimento, as citocinas pró-inflamatórias matam também o que não devem, como neurônios e células gliais”, explica Ionara.

Testes com ratos de diferentes idades submetidos a treinos diários de 20 minutos de corrida durante duas semanas apontam que o exercício altera de maneira distinta os marcadores neuroinflamatórios de ratos jovens e envelhecidos. A corrida aumentou as citocinas anti-inflamatórias em hipocampos de ratos jovens. Nos mais velhos, as citocinas anti-inflamatórias se mantiveram estáveis, mas as pró-inflamatórias foram reduzidas.

Os mesmos animais foram submetidos a testes de memória. Os mais jovens apresentaram capacidade de memorização melhor que a dos ratos mais velhos. Entretanto, independentemente da idade, os que foram submetidos ao programa de exercícios tiveram desempenho consideravelmente superior ao dos que não receberam qualquer treinamento, demonstrando o efeito positivo da atividade física sobre a memorização. Mas, assim como ocorre com a expressão gênica, o incremento da memória também é transitório e só ocorre até uma hora após a atividade.

Pesquisas também apontam que a atividade física é capaz de aumentar a ativação da enzima alfa-secretase, que, menos ativa durante o envelhecimento, é responsável por produzir fatores protetores contra a Doença de Alzheimer.

Testes com humanos e continuidade da pesquisa

Alguns estudos com humanos estão em andamento, como o que investiga o efeito da atividade física em parâmetros oxidativos, inflamatórios e epigenéticos em portadores de diabetes mellitus tipo 2, e outro que pesquisa corredores de longa distância, ambos realizados em parceria com a Escola de Educação Física, Fisioterapia e Dança da UFRGS (Esefid). O grupo também pretende seguir com os estudos, investigando a influência das atividades sobre outras áreas do cérebro e o efeito de diferentes programas de exercícios.

Artigos Científicos

SIQUEIRA, I. et al. Treadmill exercise induces age-related changes in aversive memory, neuroinflammatory and epigenetic processes in the rat hippocampus. Neurobiology of Learning and Memory, v. 101, p. 94-102, 2013.

SIQUEIRA, I. et al. Time-dependent effects of treadmill exercise on aversive memory and cyclooxygenase pathway function. Neurobiology of Learning and Memory, v. 98, p. 182-187, 2012.

SIQUEIRA, I. et al. Effect of different exercise protocols on histone acetyltransferases and histone deacetylases activities in rat hippocampus. Neuroscience, v. 192, p. 580-587, 2011.

SIQUEIRA, I. et al. Exercise intensity influences cell injury in rat hippocampal slices exposed to oxygen and glucose deprivation. Brain Research Bulletin, v. 71, p. 155-159, 2006.

UFRGS

Disponível em:http://www.cienciaemulher.org.br/pesquisas-analisam-efeito-neuroprotetor-do-exercicio-fisico/

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