SÍNDROMES DEMENCIAIS

por Rafael Claudino dos Santos e Sidney Mariano dos Santos.

  1. Síndromes Demenciais

As síndromes demenciais caracterizam-se por serem de natureza crônica, e por apresentarem vários déficits cognitivos, que incluem comprometimento da memória, do pensamento, orientação, compreensão, cálculo, capacidade de aprendizagem, linguagem e julgamento, enfim, alterações significativas o bastante para não serem consideradas apenas uma consequência do envelhecimento normal. De forma que o comprometimento da função cognitiva tende a ser acompanhado ou precedido de deterioração do controle emocional, do comportamento social ou motivação. A etiologia da demência é diversa, como a demência do tipo Alzheimer, demência vascular, devido a outras condições clínicas (HIV, traumatismo craniano, doença de Parkinson, doença de Huntington), demência resultante de drogas de abuso, medicamentos ou exposição a toxinas. Além dos casos em que há múltipla etiologia ou etiologia indeterminada (Pinel, 2005; Lent, 2008; Parmera e Nitrini, 2015).

Segundo a OMS (2018), a demência é uma das principais causas de incapacidade e dependência entre os idosos em todo o mundo, afetando cerca de 50 milhões de pessoas, das quais 60% vivem em países de baixa e média renda. Conforme a expectativa de vida aumenta, e a população envelheça, os números de casos em que a demência está presente aumentam. Estima-se que em 2050 esse número chegue a 152 milhões, e que 10 milhões de novos casos se desenvolvam a cada ano. Os custos anuais estimados para a demência são de 818 bilhões de dólares, o equivalente a mais de 1% do Produto Interno Bruto (PIB) global. Sendo que até 2030, pode chegar a 2 trilhões de dólares. Esses números, que incluem custos médicos diretos, assistência social e cuidados informais, são preocupantes pois podem vir a prejudicar o desenvolvimento social e econômico e sobrecarregar os serviços sociais e de saúde ao redor do mundo (ONUBR, 2018).

Mesmo em pessoas saudáveis, com o passar da idade, alterações estruturais são percebidas em diversos aspectos do funcionamento do sistema nervoso, como contração no volume, perda de peso do encéfalo e aumento dos ventrículos. Mesmo que a perda neuronal não seja responsável por essa diminuição. Essas mudanças resultam em alterações na memória, atividade motora, humor, padrão de sono, apetite e função neuroendócrina. Pode-se citar a fragmentação da mielina e posterior declínio da substância branca, menor densidade da arborização dendrítica dos neurônios no córtex e em outras estruturas. São percebidas reduções nos níveis de enzimas que sintetizam alguns neurotransmissores como dopamina, noradrenalina e acetilcolina, resultando em defeitos funcionais nas sinapses que utilizam esses neurotransmissores. Na maioria das pessoas, no entanto, essas alterações cognitivas não comprometem seriamente a qualidade de vida (LENT, 2008).

  • A Doença de Alzheimer

A Doença de Alzheimer (DA) é o principal tipo de demência, estima-se que 60% dos casos de demência no mundo seja causado pela DA. Esta doença começa com sintomas brandos e tem difícil diagnóstico precoce, onde o principal sintoma é a perda de memória de curto prazo. Tratando-se de uma doença progressiva neurodegenerativa, os sintomas tornam-se mais agressivos e aparente a cada dia. Na fase terminal, o portador da doença perde as funções cognitivas (linguagem, capacidade sensorial, etc.), pode apresentar sintomas psicóticos (alucinações e delírios) e nos estágios finais, tornam-se acamados e mudos. A DA atinge cerca de 1/8 da população acima de 65 anos (KANDEL, 2014).

  • Causas

A DA é uma doença multifatorial, ou seja, não tem apenas uma causa especifica, sendo então uma doença com fisiopatologia complexa de múltiplos mecanismos. Sabe-se que os fatores que influenciam no desenvolvimento da DA, podem ser de origem genética ou fatores externos, não genéticos (KANDEL, 2014).

Primeiramente, acredita-se no acúmulo de substâncias tóxicas no cérebro, denominados peptídeos β-amilóide. Estes peptídeos são fragmentos de proteína, tem a característica fibrosa e tem potencial de causar neuroinflamação, devido a ativação de células gliais (ALZHEIMER ASSOCIATION, 2017).


fig 1. Presença de APP na membrana plasmática.

A formação de peptídeos β-amilóide envolve uma série de processos que começa a partir da Proteina Precursora de Amiloide (PPA) ou do inglês Amyloid Precussor Protein (APP). Esta é uma proteína encontrada na membrana plasmáticas de neurônios e células gliais (figura 1). Existem certas enzimas que clivam PPA em fragmentos, chamada de secretases, são elas α-secretase, β-secretase e γ-secretase (ALZHEIMER ASSOCIATION, 2017).

Cada secretase é capaz de clivar a APP em um local especifico, assim, cada uma forma um fragmento diferente. Quando há ação de α-secretase, peptídeos não tóxicos são formados, na qual, não se sabe ainda a função fisiológica desses peptídeos. A formação de peptídeos tóxicos acredita-se que venha da clivagem da γ-secretase, seguida de uma segunda clivagem de β-secretase, formando peptídeos β-amilóide. A atividade de secretases e formação de APP, podem ser regulados por diversos fatores, que modulam a formação de peptídeos β-amilóide, podendo ser estes genéticos ou não (figura 2) (KANDEL, 2014).


Fig 2. Fatores que influenciam na formação de peptídeos β-amilóide.

Esses peptídeos tóxicos são formados individualmente, porém, eles tem a capacidade de se agregar e formar grandes placas de agregados tóxicos (figura 3) de origem β-amilóide, que causa grande dano ao tecido nervoso, ativação de células gliais, consequentemente, neuroinflamação. O processo inflamatório tem um grande gasto energético e geração de espécies oxidativas, que por sua vez lesionam tecido nervoso, além de liberar diversas citocinas inflamatórias, na qual, diminuem a capacidade sináptica de neurônios (ALZHEIMER ASSOCIATION, 2017).

fig 3. Acúmulo de placas β-amilóide no cérebro.

Ainda há muito a ser esclarecido em relação a Doença de Alzheimer e todos outros tipos de doenças degenerativas. A agregação de peptídeo β-amilóide como causa da doença deste tipo de demência é apenas um dos achados científicos, porém, já é conhecido sua grande influência no processo de neurodegeneração.           

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

LENT, R. Neurociência da mente e do comportamento. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2008.

ONUBR.  2018. OMS: número de pessoas afetadas por demência triplicará no mundo até 2050. Disponível em: <https://nacoesunidas.org/oms-numero-de-pessoas-afetadas-por-demencia-triplicara-no-mundo-ate-2050/>. Acesso em 05. Out. 2018.

PARMERA, J. B.; NITRINI, R. Demências: da investigação ao diagnóstico. Rev Med (São Paulo). jul.-set.;94(3):179-84, 2015.

PINEL, J. P. J. Biopsicologia. 5. Ed. Porto Alegre: Artmed, 2005.

KANDEL, E.R.; SCHWARTZ, J.H.; JESSELL, T.M. Princípios da Neurociência.5ª ed.  São Paulo: Manole, 2014.

ALZHEIMER ASSOCIATION. 2017 Alzheimer’s disease facts and figures. Alzheimer’s & Dementia 13 (2017) 325–373.

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