Cefaleias-visão geral- por Camila Machado
Introdução

A cefaleia é responsável por grande parte das consultas nas unidades de saúde e está associada a um alto impacto socioeconômico, perda da produtividade no trabalho e diminuição da qualidade de vida. Na maioria dos casos, não está relacionada a outras condições clínicas e, quando presentes, costumam ser condições simples, como infecções de vias aéreas e distúrbio da articulação temporomandibular. Entretanto é necessário atentar para sinais de alerta que indiquem cefaleia secundária a eventos mais graves, como hemorragia ou lesão expansiva.
As cefaleias são classificadas em primárias, quando não há outra condição clínica subjacente à dor, e, em secundárias, quando a dor pode ser atribuída como consequência de outra condição clínica. As cefaleias primárias são as mais prevalentes.
A fisiopatologia da cefaleia ainda possui várias lacunas a serem preenchidas. Constantes estudos sobre essa vertente são necessários para entendermos melhor seu desenvolvimento.
Revisão bibliográfica
A cefaleia é uma doença de alta prevalência que acomete indivíduos de idades variadas, e que traz grande prejuízo funcional e social ao indivíduo, afetando a produtividade, concentração e interação com o meio, é uma patologia frequente na faixa etária dos 20-50 anos. É a mais comum das síndromes dolorosas, com importante impacto nas atividades diárias dos indivíduos. (LOPES, et al., 2015).
A cefaléia é conceituada como qualquer tipo de dor que acomete a caixa craniana da linha da órbita ocular até a parte de trás da cabeça. Dores na parte abaixo dos olhos são chamadas de dores faciais. (SPECIALI et al., 2016).
A cefaleia é um dos principais problemas de saúde em todo o mundo e o segundo tipo mais comum é a enxaqueca, com uma prevalência global entre os adultos maior que 10 %. No Brasil, a prevalência da migrânea é estimada em 15,2 %. (MATTOS et al., 2017).
Cefaleia ou dor de cabeça é um distúrbio causado pela sensibilização de nociceptores que encontram-se na periferia do crânio, causando dores em regiões específicas da cabeça. Diversos fatores podem desencadear o processo patológico. É mais comum em mulheres, mas pode acometer homens e crianças. Pode ser crônica, abrupta, de modo contínuo ou subcontínuo.
É uma dor de origem cortical ou no tronco cerebral, podendo evoluir por crises ou não. Tem um caráter pulsátil ou contínua, podendo ser uni ou bilateral.
Podemos agrupar a cefaleia em dois diferentes grupos etiológicos; cefaleias primárias, que compreende a migrânea, cefaleia em salvas, a cefaleia tensional; e o grupo das cefaleias secundárias que ocorrem devido à presença de uma patologia. (LOPES, et al., 2015).
Enxaqueca ou Migrânea

A enxaqueca é considerada um distúrbio neurovascular com antecedentes genéticos complexos. A ativação do sistema trigeminovascular com subsequente liberação de neuropeptídeos vasoativos tem sido proposta para explicar ataques de enxaqueca. (DOMINGUES et al., 2016).
Atualmente, é amplamente aceito que a enxaqueca deva ser vista como um transtorno complexo da rede cerebral com uma forte base genética que envolve múltiplas regiões corticais, subcorticais e do tronco cerebral para explicar a dor e a ampla constelação de sintomas que caracterizam o ataque. (PULEDDA et al., 2016).
A enxaqueca envolve ativação e sensibilização de vias trigeminovasculares, bem como núcleos do tronco encefálico e diencefálico. Além disso, uma desregulação primária do processamento sensorial provavelmente resultará na constelação de sintomas neurológicos que afetam nossos sentidos. Tem sido sugerido que a enxaqueca pode ser considerada como um estado cerebral de excitabilidade alterada.
Estudos demonstram que a capacidade de desenvolver ataques de enxaqueca é refletida por alterações estruturais nas áreas de processamento da dor, como o córtex cingulado anterior e o sistema somatossensorial do trigêmeo. Pela natureza do método, ainda não está claro se essas alterações são consequência de ataques de enxaqueca repetitivos ou se estão envolvidas na fisiopatologia da enxaqueca. (GOADSBY et al., 2017).
Segundo a Fundação Americana de Enxaqueca, se pelo menos um dos pais tem o trantorno, a chance do filho desenvolver fica entre 50% e 75%. É considerada a décima causa mais comum de “anos vividos com deficiência” em mulheres. Há uma frequente coexistência de depressão e ansiedade, aumentando o absenteísmo no trabalho e a cronificação da enxaqueca, reduzindo a qualidade de vida. (MATTOS et al., 2017).
No Brasil, a prevalência anual da migrânea é de 15.8%, acometendo cerca de 22% das mulheres e 9% dos homens, com pico de prevalência entre 30 e 50 anos. A migrânea sem aura (75% dos casos) é mais frequente que com aura (25% dos casos). Cerca de 80% dos pacientes têm um familiar direto acometido. Caracteriza-se por crises recorrentes constituídas por até cinco fases (nem sempre estão presentes todas elas).
Sintomas premonitórios: precedem a cefaleia por horas ou até dias. Nesta fase o paciente pode apresentar irritabilidade, com raciocínio e memorização mais lentos, desânimo e avidez por alguns tipos de alimentos.
Aura: complexo de sintomas neurológicos que se desenvolve gradualmente (ao longo de no mínimo 5 minutos) e dura até 60 minutos. A aura típica é um distúrbio visual constituído por pontos fosfenos, perda ou distorção de um dos hemicampos visuais ou parte deles. Às vezes associam-se parestesia unilateral e/ou disfasia. (SPECIALI et al., 2018).

Cefaleia em salvas
Cefaleia primária com maior incidência nos homens. Comum entre os adultos jovens. Pode evoluir para crises de duração entre 30 – 90 minutos.. Tem como principal característica o lacrimejamento e congestão nasal.
A dor aguda exacerbadamente grave só é mediada pela ativação da primeira divisão (oftálmica) do nervo trigêmeo, enquanto os sintomas autonômicos resultam da ativação do fluxo parassimpático cranial do VII par craniano. O curso recidivante-remitente, sua variação sazonal, e a regularidade no sentido horário são características características, mas inexplicáveis, do distúrbio.
A impressionante ritmicidade circadiana da cefaleia em salvas levou à sugestão de uma origem central para o seu início. Concentrações substancialmente baixas de testosterona plasmática durante o período de cefaleia em salvas em homens forneceram a primeira evidência de envolvimento hipotalâmico na cefaleia em salvas. (MAIO et al., 1998).

Cefaleia Tensional
Acredita-se que a fisiopatologia da cefaleia tensional esteja associada a mecanismos periféricos (sensibilidade aumentada à dor miofascial e sensibilização periférica de nociceptores miofasciais) e centrais (sensibilização de neurônios de segunda ordem e córtex somatossensorial).
Níveis séricos de interleucina- 8 aumentados em pacientes com cefaleia do tipo tensional sugere que mecanismos pró-inflamatórios podem participar da fisiopatologia da cefaleia do tipo tensional. (DOMINGUES et al., 2016).
Conclusão
A cefaleia em sua diversidade de tipos ainda é negligenciada como uma patologia incapacitante e que acomete milhares de pessoas em todo o mundo. Ahá uma grande necessidade de estudos que centralize seus objetivos no conhecimento profundo da fisiopatologia da doença, buscando assim enteder melhor os mecanismos de ativação e evolução das cefaleias.
Embora raramente a cefaleia esta associada a uma doença grave, sua relação com algo mais sério pode existir, exigindo mais atenção aos episódios de dores de cabeça repentinos.
Por fim, é necessário a realização de estudos que busquem melhorar a qualidade de vida, evitando os impactos socioeconômicos na população decorrentes de patologias tidas como normais.
Camila Machado-bióloga, mestranda pela Faculdade de Ciências da Saúde-UFGD
Referências
1. Puledda F, Messina R, Goadsby PJ. Uma atualização sobre a enxaqueca: compreensão atual e direções futuras. J Neurol . 2017; 264 (9): 2031-2039.
2. Goadsby PJ, Holland PR, Martins-Oliveira M, Hoffmann J, Schankin C, Akerman S. Pathophysiology of Migraine: A Disorder of Sensory Processing. Physiol Rev. 2017;97(2):553-622.
3. Maio A, Bahra A, Buchel C, Frackowiak RS, Goadsby PJ. Ativação hipotalâmica em ataques de cefaléia em salvas. Lancet (Lond, Engl) 1998; 352 : 275-278.
4. UFSC. Eventos agudos na atenção básica. Cefaleia. Universidade Federal de Santa Catarina- Campus Universitário, 88040-900 Trindade – Florianópolis – SC, 2013.
5. Classificação Internacional de cefaleias. 3ª edição – Tradução Portuguesa, 2014.
6. SPECIALI, J.G., FLEMING, N.R.P., FORTINI, I. Cefaleias primárias: dores disfuncionais. Rev. dor, São Paulo , v. 17, supl. 1, p. 72-74, 2016 .
7. MATTOS, Ana Carolina Musser Tavares de et al . ID-Migraine questionnaire and accurate diagnosis of migraine. Arq. Neuro-Psiquiatr., São Paulo , v. 75, n. 7, p. 446-450, Jul 2017 .
8. DOMINGUES, Renan B. et al . Serum levels of adiponectin, CCL3/MIP-1α, and CCL5/RANTES discriminate migraine from tension-type headache patients. Arq. Neuro-Psiquiatr., São Paulo , v. 74, n. 8, p. 626-631, Ago. 2016 .