Dislexia: quando aprender a ler não é uma aventura prazerosa – Olga Valéria C. A. Andrade, extraído do livro “Aprendizagem, comportamento e emoções na infância e na adolescência-uma visão transdisciplinar”- Elisabete Castelon Konkiewitz (Org.) editora UFGD, 2013.

dyslexia“Um dia, me deu um clique na cabeça. Mamãe tinha aberto sobre a mesa da sala de jantar o método Regimbeau: contemplei a imagem de uma vaca e as duas letras, c, h, da palavra “vache” que se pronunciavam ch. Compreendi subitamente que elas não possuíam um nome à maneira dos objetos, mas que representavam um som: compreendi o que é um signo. Aprendi a ler depressa.” (Simone de Beauvoir)
Introdução
Devido à enorme importância que a língua escrita representa em nossa cultura, é muito comum ouvirmos a expressão (já quase um clichê!) que diz que o acesso ao “mundo letrado” está recheado de prazeres e aventuras e que ao aprendermos a ler teremos acesso a um “tesouro” chamado conhecimento. Tal proposta, apresentada dessa forma, cria uma ilusão, tanto nas crianças como nos adultos, de que o aprendizado da leitura e escrita é simples e natural, e pode ser adquirido de forma tão fácil quanto aprender a falar. Quando isso não acontece, é comum vermos na escola alunos, pais e professores angustiados e culpados, sem entenderem o que está acontecendo com a criança.
É inegável a importância da aquisição da leitura e da escrita em nossa vida, mas neste capítulo chamamos atenção para uma pequena, mas significativa parcela da população infantil que não vivencia essa “aventura” de forma tão tranquila assim. Estamos falando de aproximadamente 5 a 17% da população em idade escolar nos EUA1, que sofre com uma desordem cognitiva que afeta principalmente a aquisição da leitura, conhecida por dislexia do desenvolvimento. Embora não exista uma prevalência de dificuldades de aprendizagem em nosso país por não existir essa categoria em nosso sistema educacional, estima-se que a prevalência seja em torno de 8%2. As dificuldades na aquisição da leitura-escrita na dislexia se manifestam apesar de uma inteligência completamente normal, oportunidades educacionais, motivação adequada e ausência de qualquer déficit sensorial ou dano neurológico aparentes1,3,5. Portanto, essas crianças, apesar de terem o desejo de aprender a ler e possuírem aparentemente todas as habilidades necessárias, bem como condições socioculturais e emocionais, são portadoras de um problema frustrante e persistente, de origem genético-neurológica (ou constitucional) que faz com que passem por sérias dificuldades quando iniciam o processo de alfabetização2,5.
O consenso atual é que a causa da dificuldade na aquisição da leitura-escrita nas crianças disléxicas está no processo de decodificação dos símbolos visuais (grafemas) em símbolos acústicos (fonemas) e vice-versa. De acordo com a literatura científica dos últimos 35 anos3,10, essa dificuldade em construir um sólido conhecimento das relações letra-som nas crianças disléxicas está fortemente associada a prejuízos no desenvolvimento da linguagem que parecem específicos do processamento fonológico. Entretanto, prejuízos do processamento visual10 também parecem contribuir para o quadro da dislexia e até mesmo caracterizar um subtipo minoritário de “dislexia visual” ou “diseidética” em oposição à “dislexia disfonética”. Os três principais sintomas subjacentes ao prejuízo no processamento fonológico na dislexia são: a consciência fonológica, a memória verbal (ou fonológica) de curto prazo e a nomeação rápida de figuras3,5,6,7.

por Camila Falchi
por Camila Falchi

A consciência fonológica se refere à percepção consciente e plena dos sons linguísticos, e a grande maioria das crianças disléxicas se caracteriza por uma dificuldade em representar e analisar mentalmente os padrões de som da sua língua de uma forma detalhada e específica. Dentre as principais tarefas usadas para avaliarmos a consciência fonológica está decidir se duas palavras rimam (tarefas de rima), identificar o mesmo fonema inicial das palavras (tarefas de aliteração), segmentar as palavras em sílabas (segmentação silábica) e, principalmente, segmentar as palavras nos seus fonemas constituintes (tarefas de segmentação fonêmica que medem a capacidade conhecida por consciência fonêmica)3. Outra tarefa muito usada é pedir para a criança pronunciar pseudopalavras (sequências de letras construídas com estruturas ortográficas possíveis em português, porém destituídas de significados)3. Além da fraca consciência fonológica, os disléxicos, frequentemente, apresentam também dificuldades na nomeação rápida de figuras de objetos conhecidos ou dígitos, bem como prejuízo na memória verbal de curto prazo, que é medida pedindo-se à criança que repita uma sequência de palavras ou dígitos dada pelo examinador3,5,6,7. Entretanto, é importantíssimo termos em mente que a inteligência geral não se correlaciona com a dislexia porque os déficits fonológicos nas crianças disléxicas são, principalmente, déficits sensório-perceptivos de baixo nível cognitivo (relacionados ao processamento auditivo) e que afetam o processo de decodificação dos símbolos visuais (grafemas) em símbolos acústicos (fonemas)1,3.
Do ponto de vista da prática educacional, as contribuições no sentido de se desenvolverem formas objetivas e práticas de análise e avaliação das habilidades subjacentes às aquisições da leitura e escrita pelo educador são extremamente importantes, mas ainda escassas. É fundamental o desenvolvimento de atividades práticas para a sala de aula que funcionem como ferramentas pré-diagnósticas para a identificação de crianças com dificuldades específicas nessas habilidades e, portanto, com provável risco de dislexia. Entretanto, ainda encontramos muitos equívocos sendo cometidos nas escolas, provavelmente decorrentes de uma política educacional que ainda não reconhece essa categoria de transtorno de aprendizagem e a pouca familiaridade dos educadores, de um modo geral, com o conhecimento científico sobre os processos cognitivos e neurofuncionais relacionados à linguagem escrita e sobre a sintomatologia da dislexia e sua base genético-neurológica. Esses fatores associados à adoção oficial12,13 de um sistema de alfabetização que não prioriza as relações letra-som, causando falhas nesses mecanismos semelhantes às que ocorrem na dislexia5, levam a uma enorme quantidade de crianças erroneamente rotuladas de portadoras de transtornos de aprendizagem.
Portanto, esses problemas na educação brasileira fazem com que se confundam frequentemente transtornos de aprendizagem, isto é, problemas de aprendizagem de origem constitucional e intrínsecos à criança, com dificuldades de aprendizagem que são problemas de origem ambiental ou extrínsecos às crianças, dentre os quais se incluem a metodologia de alfabetização inadequada, problemas emocionais-afetivos na família e/ou na escola etc. Outra consequência negativa de nosso modelo educacional é a falta de conhecimento e instrumentos adequados para diferenciar “dificuldades” e “transtornos” de aprendizagem.
Nesse sentido, o foco principal deste capítulo será fornecer aos pais e professores pré-escolares e alfabetizadores, práticas que favoreçam um bom desenvolvimento da linguagem oral, visando ao desenvolvimento da consciência fonológica como o principal fator preventivo para uma posterior aquisição do código escrito. Também procuraremos fornecer informações sobre o desenvolvimento da linguagem oral e escrita que, se bem compreendidas, facilitarão a reflexão do professor sobre a forma mais eficaz de intervir com crianças que possam estar “em grupo de risco” para dislexia.
Por que prejuízos fonológicos afetam a aquisição da linguagem escrita?
A pergunta levantada no subtítulo acima e a frase de Simone de Beauvoir, com a qual iniciamos este capítulo, estão inextricavelmente ligadas a outra pergunta que tem sido alvo de um intenso e caloroso debate na educação brasileira: por que devemos ensinar as relações letra-som na alfabetização7,8? De um lado do debate estão as abordagens de alfabetização que se focam nas unidades menores da linguagem oral (fonemas e sílabas) e escrita (letras e combinações de letras), enfatizando-se o pareamento dessas unidades, isto é, as relações grafo-fonológicas; por isso, essas abordagens são referidas como “métodos de acesso indireto ao significado”9 ou com “ênfase no código”10. Do outro lado do debate estão as abordagens que sustentam que as crianças podem aprender a ler tão naturalmente como aprendem a falar e, sendo a compreensão o principal objetivo da leitura, o ensino da leitura e escrita deve se basear no uso de textos ao invés de unidades menores, isto é, na busca de significado desde o início; por isso, essas abordagens são conhecidas como “métodos de acesso direto ao significado”9 ou simplesmente com “ênfase no sentido”10.
Em nosso país, esse debate surgiu com as críticas que o livro Psicogênese da Língua Escrita, de Emília Ferreiro e Ana Teberosky, a principal referência da abordagem com ênfase no significado no Brasil7 disparam contra as abordagens com ênfase no código, rotuladas por elas como abordagens tradicionais ultrapassadas que se baseiam em um aprendizado mecânico e reducionista de relações entre unidades menores não significativas que mais prejudica a alfabetização do que alfabetiza (p.24, 273). Inspiradas na abordagem Whole-Language (linguagem global) de instrução de leitura, criada nos EUA por Kenneth Goodman e Frank Smith no início da década de 1970, Ferreiro & Teberosky7 reivindicaram que “é injustificável a iniciação da lecto-escrita, concebida como uma transcrição dos grafemas em fonemas” (p.28) porque “ler não é decifrar” (p.34, 269), pois uma vez que “a escrita não é a transcrição da língua oral”(p.271), mas sim “um sistema de signos que remetem diretamente ao significado” (p.272), a verdadeira leitura, consequentemente, é “adivinhar antecipando continuamente o texto escrito através de predições semânticas e sintáticas” (p.270).
Emília Ferreiro e Teberosky (p.23-25)7 assumiram as reivindicações de Keneth Goodman7, o grande baluarte do Whole-Language, de que a leitura por meio do significado é sustentada por descobertas revolucionárias da nova ciência psicolinguística alavancada pela teoria do grande linguista norte-americano Noam Chomsky. Chomsky11 argumentou que os bebês já vêm ao mundo com um dispositivo biopsíquico de aquisição da linguagem (DAL) caracterizado por uma percepção universal dos fonemas e um conhecimento implícito dos princípios abstratos subjacentes às regras fonológicas e gramaticais e o aplicam automaticamente à fala que eles ouvem à sua volta, aprendendo de forma natural e ativa qualquer língua a que sejam expostos.
Os defensores da abordagem com ênfase no significado acreditam que sendo a escrita também “linguagem”, as crianças aprenderiam a ler e escrever tão naturalmente quanto aprendem a falar usando seu “DAL”, de forma que o ensino focado nas unidades menores que não possuem significado prejudica enormemente o aprendizado da leitura. Ferreiro e Teberosky7 assumem enfaticamente as reivindicações do francês Jean Foucambert, representante da abordagem Whole-Language na França (p.271), de que a ênfase no código é a “chave de todos os males” da alfabetização e consiste em uma “armadilha” ou um “presente envenenado” que “coloca a criança em risco de fracassar”, de modo que “as dislexias não são perturbações da leitura, mas sim do decifrado e o decifrado em si mesmo não é uma atividade de leitura” (p.273). Em suma, na visão Whole-Language, as relações grafema-fonema jamais deveriam ser ensinadas e as crianças jamais deveriam ser corrigidas ao cometerem erros na leitura10.
Então, como se aprende a ler na visão com ênfase no significado? A resposta é: deve-se aprender a ler as palavras por inteiro, como “logogramas” (isto é, não pelas suas partes, como um sinal visual holístico associado a uma palavra falada) e mesmo que algumas palavras permaneçam desconhecidas não há problema nenhum, pois a exatidão não é o objetivo da leitura7,8. Os defensores da abordagem com ênfase no significado, como Ferreiro e Teberosky (p.215-218)7 e Bajard (p.496-500)8, argumentam que esse tipo de “leitura global” da palavra permite o acesso direto ao significado sem necessariamente passar pelo processo de decodificação e nem pela extração da pronúncia anterior à extração dos sentidos (p.496)8. Nessa perspectiva, a própria decodificação visuo-fonológica é possível pela via do significado e não o contrário (p.272)7.
No Brasil, a alta taxa de repetência na primeira série, que em 1981 alcançava a cifra dos 70%, principalmente devido à evasão escolar, foi um dos fatores que mais impulsionou a adesão das abordagens alfabetizadoras de base construtivista, particularmente as baseadas nas noções defendidas por Ferreiro e Teberosky (1985), as quais vêm fundamentando a redefinição e a reorganização das políticas educacionais e práticas pedagógicas até hoje12,13. Entretanto, após 30 anos dessa suposta renovação na educação, o Brasil ainda não solucionou os problemas de alfabetização anteriores, que ainda assolam o país de forma mais perturbadora, com índices muito mais alarmantes nos dias de hoje13. Atualmente, preponderam as imensas dificuldades de leitura e as defasagens nas correlações esperadas de competência/série – ou ciclo (p.263)12, de modo que aproximadamente 60% dos alunos de 4ª série (5º ano) apresentam níveis altamente insatisfatórios e mais de 20% não desenvolveram habilidades de leitura mínimas, tornando o Brasil um dos piores países do mundo em alfabetização12,14. Em outras palavras, houve uma mudança qualitativa de um problema de natureza social (a evasão escolar) para um problema metodológico, pois hoje o problema maior está nas crianças que estão frequentando a escola, refletido na enorme discrepância entre competência de leitura/série12.

pintura por Camila Falchi
pintura por Camila Falchi

Por que isso ocorreu? A resposta é porque as assunções teóricas dos defensores da abordagem com ênfase no significado são, no mínimo, muito equivocadas. Comecemos, então, pelos princípios básicos da nova psicolinguística consubstanciados na famosa quarta conferência do Instituto Nacional da Saúde e Desenvolvimento da Criança dos EUA (sigla em inglês NIHCD), realizada em 1971 e cujo tema central foi a relação entre fala e aprendizagem da leitura15. Ferreiro e Teberosky (p.25)7 reivindicaram corretamente que essa conferência tornou-se o grande marco histórico da nova psicolinguística, mas se equivocaram ao afirmar que ela dá suporte às suas reivindicações teórico-empíricas.
O ponto de partida daquela conferência foi exatamente o claro contraste entre a facilidade e naturalidade com que as crianças adquirem a linguagem oral e a dificuldade com que adquirem a linguagem escrita (p.1-2, 25-45)15. Um dos principais consensos alcançados na conferência foi que a linguagem oral é uma atividade linguística primária, isto é, remonta à própria origem da espécie humana (que hoje sabemos que se deu há mais de 200 mil anos) e depende de alguns mecanismos neurais inatos e muito especiais, intricadamente ligados em todos os seres humanos normais ao trato vocal e ao ouvido (p.133, 373)15. Em contraste, a escrita é uma atividade linguística secundária e parasítica da linguagem oral, isto é, uma invenção cultural recente de aproximadamente 6.000 anos de idade, com a escrita alfabética tendo menos de 3.000 anos (p.373)15 e cujos sinais visuais artificiais (não naturais) não ativam natural e automaticamente os dispositivos inatos de aquisição da linguagem (que Chomsky chamou de DAL), mas, em vez disso, precisam inicialmente ser transcodificados na linguagem oral. Essas características da linguagem escrita tornam sua aquisição não natural e laboriosa (p.293)15.
Na conferência, todos os linguistas (p.57-80, 133-146, 148-157)15 reiteraram as reivindicações do próprio Noam Chomsky de que a ortografia é a representação morfofonêmica da fala, isto é, representa a fala tanto no nível da palavra (morfo) quanto das unidades menores (sílabas e fonemas). Desde a metade do século passado, todos os grandes estudiosos da arqueoantropologia da escrita, como Gelb16, Sampson17 e DeFrancis,18 afirmam que não devemos confundir escrita logográfica (como a escrita chinesa), cujos sinais visuais representam sons específicos da fala, (palavras) com escrita ideográfica, cujos sinais não representam nenhuma palavra específica e remetem diretamente ao significado (como sinais de trânsito). Esse equívoco é frequentemente cometido por Ferreiro e Teberosky (p.215-218)7 e Bajard (p.496- 500)8 que sempre se referem a sistema ideográfico e logográfico como sendo praticamente a mesma coisa.
Finalmente, todos esses linguistas são unânimes em afirmar que nenhum sistema de escrita prático é ideográfico, em vez disso, todos os verdadeiros sistemas de escrita são baseados em um código visual de representação morfofonêmica da fala16,17,18. Os estudos empíricos apresentados na conferência por Shankweiler e Liberman (p.293-317)15 mostraram de maneira inequívoca que as crianças com dificuldades de leitura têm a leitura deficiente no nível da palavra e não do texto, e que essas dificuldades residiam, principalmente, na conversão letra-som.
No capítulo final da 4ª conferência do NIHCD, intitulado “Reflexões sobre a conferência” (p.373-381)15, Miller (1972, p.376)15 concluiu que a questão mais importante para a aquisição da leitura e recorrentemente discutida na conferência foi o que o linguista Ignatius Mattingly (p.133-146)15 chamou de “consciência linguística” (hoje referida como consciência metalinguística), a análise consciente dos vários níveis estruturais da língua, incluindo a semântica, a sintaxe e a fonologia, sendo esta última a análise dos sons linguísticos nos níveis morfológico (palavras), silábico e fonêmico (este último sumamente importante para a escrita alfabética). Miller também afirmou que nos processos de leitura ficou clara a “[…] aparente necessidade de se passar através de representações acústicas, articulatórias, fonéticas, ou representações fonológicas abstratas das palavras que se está lendo”, e concluiu que, embora a decodificação da escrita nos sons da fala não seja a única rota concebível na leitura, ela parece, sem dúvida, ser a mais eficiente (p.378)15. Finalmente, Miller (p.376)15 afirmou que independentemente de qualquer coisa a mais que possa ser dita sobre a conferência, a grande contribuição que ela proporcionou foi o reconhecimento geral de que as habilidades de leitura devem derivar, em última análise, da consciência linguística, a qual seria uma fonte crítica das dificuldades na aquisição de leitura independente dos aspectos socioeconômicos e das variações dialetais.
Portanto, ao contrário do que pretendem sugerir Ferreiro e Teberosky7, a 4ª conferência do NIHCD, marco da nova psicolinguística, representou, por meio do estabelecimento em bases sólidas do conceito de consciência linguística e sua importância para a aquisição da linguagem escrita, as bases teórico-empíricas que impulsionaram outros estudos, principalmente no laboratório Haskins nos EUA, na Universidade de Oxford na Inglaterra e na Universidade de Bruxelas na Bélgica, que deram origem ao que hoje conhecemos como “consciência fonológica”, cuja relação com a aquisição da linguagem escrita é considerada uma das descobertas de maior sucesso na moderna psicologia (p.47)19, incluindo a importância da memória verbal (ou fonológica) de trabalho (ou curto prazo) e nomeação rápida3,4,5,6.

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Hoje, juntamente com trinta anos de evidências arqueoantropológicas, linguísticas e psicológicas, acrescentam-se as evidências neuropsicológicas mostrando que a dislexia não é uma invenção e não consiste de dificuldades de aprendizagem de origem sociocultural. Estudos de lesão cerebral no hemisfério esquerdo que provocam danos na compreensão da linguagem oral20, como nas afasias de expressão e compreensão, mostram que déficits de compreensão e expressão estão quase que invariavelmente associados a déficits semelhantes na linguagem escrita. Estudos de neuroimagem em indivíduos sadios21 também são consistentes com os estudos de lesão e mostram que, mesmo na leitura silenciosa, os leitores hábeis ativam as áreas visuais do córtex occiptotemporal antes das áreas auditivas/fonológicas do giro temporal superior esquerdo e estas, por sua vez, ativam-se antes das áreas envolvidas na integração dos significados no lobo frontal inferior esquerdo. Finalmente, estudos de neuroimagem mostram, consistentemente, que há diferenças no volume e na ativação dessas áreas linguísticas do cérebro dos indivíduos disléxicos (crianças e adultos) em relação aos não disléxicos. Durante a leitura ou tarefas linguísticas, crianças e adultos disléxicos apresentam uma hipoativação (ativação mais fraca) no córtex temporoparietal esquerdo (envolvido na compreensão auditiva da linguagem); da mesma forma, estudos de volumes das áreas cerebrais revelam um menor volume de massa cinzenta nessas áreas nos indivíduos disléxicos22. Estudos de neuroimagem, no Brasil, também apontam na mesma direção revelando alterações no córtex temporal de crianças com diagnóstico de dislexia23.
O desenvolvimento da linguagem oral
A criança aprende naturalmente a falar a linguagem do grupo em que vive (língua materna). A aquisição e desenvolvimento da competência linguística depende de dois aspectos: da biologia e do ambiente. O cérebro é a principal ferramenta que sustenta as aquisições linguísticas determinadas socialmente. São as áreas perisilvianas em volta da fissura de Sylvius, que separa o lobo temporal dos lobos frontal e parietal (parte superior do lobo temporal e áreas inferiores dos lobos frontal e parietal), principalmente no hemisfério esquerdo, as responsáveis pela percepção e produção dos sons linguísticos, respectivamente27. O bebê de 0 aos 12 meses apresenta uma notável evolução da fala no que diz respeito a estes dois aspectos: de percepção e produção dos sons linguísticos. Hoje já temos evidência de que essa evolução é notada por alterações dos padrões neurofisiológicos de ativação nessas crianças, na presença de estímulos linguísticos24.
Com relação à percepção, dizemos que entre 0 a 6 meses aproximadamente, os bebês são “linguistas universais inatos”24, pois discriminam contrastes fonéticos de todas as línguas do mundo. Por volta dos 6 meses, começam a ter percepção das vogais, e aos 9 meses, reconhecem combinações de sons específicos da própria língua. Aos 11 meses, já são especialistas na sua língua materna e esse aspecto marca o declínio da percepção de consoantes estrangeiras. É o ambiente sobrepujando a biologia!
Com relação à produção, até os 3 meses, os bebês produzem sons não linguísticos. Somente após essa idade é que eles começam a emitir sons parecidos com vogais e, aos 6 meses, produzem um balbucio canônico universal, os famosos “pá-pá”, “má-má”, “dá-dá”. Nessa fase, toda mãe coruja e pai orgulhoso pensam que o bebê aprendeu a falar suas primeiras palavras. O que não sabem é que esses sons são universais na evolução da fala dos bebês. Aos 10 meses aproximadamente, inicia-se a produção da fala específica da língua materna, e aos 12 meses, o aprendizado das primeiras palavras24.
Após os primeiros 12 meses, vivenciamos uma expansão no vocabulário da criança que não para mais ao longo de toda a vida. A todo o momento estamos aprendendo palavras novas, de acordo com nossa necessidade. Dos 12 aos 18 meses, o vocabulário expressivo de uma criança gera em torno de 50 palavras. Aos 24 meses, ela mantém um vocabulário de 200 a 300 palavras, e aos 6 anos, domina mais ou menos 13.000 palavras. Dos 15 aos 17 anos, seu léxico é composto de 60.000 palavras24.
Nessa escala de desenvolvimento da linguagem oral, destacamos que, por volta dos 5 anos, a criança já tem domínio da fonologia e da sintaxe de sua língua materna. Portanto, se dificuldades de fala e de linguagem como atrasos na aquisição, problemas articulatórios persistentes, problemas para encontrar palavras, desenvolvimento imaturo da sintaxe, dificuldades com as habilidades de segmentação e fusão2,3 persistirem após essa idade, a criança deve ser encaminhada para avaliação fonoaudiológica, pois os distúrbios da linguagem muitas vezes comprometem o processo de alfabetização2.
Uma série de estudos revela que o déficit nessas capacidades precoces de percepção auditiva da linguagem, presente nos bebês desde o nascimento, tem um importante papel no desenvolvimento posterior da linguagem, tanto no vocabulário (léxico fonológico) quanto na compreensão24. Entretanto, não podemos generalizar o fato de que todas as crianças que apresentam problemas de fala e de linguagem terão dificuldades com a alfabetização, visto que as crianças com problemas de fala constituem uma população bastante heterogênea e que muitas crianças disléxicas apresentam problemas mais notáveis no processamento auditivo do que na oralidade2. Dependendo da natureza do problema, muitos casos são resolvidos com uma intervenção fonoaudiológica precoce. Entretanto, estudos realizados em crianças pertencentes a famílias com histórico familiar de problemas de fala e linguagem e/ou alfabetização possuem uma maior probabilidade de terem problemas com a leitura e com a ortografia2,3,4.

A consciência fonológica e a dislexia

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Hoje, já é um consenso na literatura que os problemas inesperados e persistentes dos indivíduos disléxicos são causados, principalmente, por deficiências de linguagem no domínio fonológico (consciência fonológica, memória fonológica de trabalho e nomeação rápida), o que os impedem de se alfabetizarem em um ritmo normal1,2,3,4,5.
É importante ressaltar que para se ter uma boa compreensão do que se está lendo, é necessário ter algumas estratégias de reconhecimento de palavras que no leitor iniciante são realizadas, principalmente, por meio da correspondência fonema-grafema, um conhecimento que denominamos de “princípio alfabético”. É desse processo inicial que depende uma leitura e escrita eficaz. Aos poucos, por meio das experiências escolares, vai se reforçando a conexão entre os padrões ortográficos e fonológicos das palavras, e esse sistema de reconhecimento visual fica mais rápido e eficiente; é quando o leitor passa a um segundo estágio de leitura conhecido como leitura lexical, no qual, inicialmente, palavras de alta frequência (palavras muito usadas na língua) são armazenadas e reconhecidas rapidamente. Entretanto, a aquisição do princípio alfabético depende da capacidade de analisar conscientemente os fonemas constituintes das palavras, chamada de “consciência fonêmica”. Se levarmos em conta que na fala oral as palavras são pronunciadas quase em um “continuum”, sem pausa entre elas, vemos que a consciência fonêmica é uma tarefa nada simples.

Alfabetização-método fônico
Estudos desde a década de 1970 mostram que embora as crianças sejam capazes de empregar intuitivamente suas habilidades linguísticas de forma natural e eficiente nas suas interações comunicativas diárias, elas ainda não possuem uma “consciência metalinguística” (capacidade de analisar a língua como um objeto no nível semântico, sintático e fonológico). Na realidade, a consciência fonêmica é uma habilidade metalinguística que se insere no aspecto mais amplo da “consciência fonológica”. Assim como todas as habilidades metalinguísticas, a emergência da consciência fonêmica não é repentina, mas sim um processo de amadurecimento biológico e desenvolvimento cognitivo dependente das estimulações do meio; esse desenvolvimento é caracterizado por um contínuo de etapas evolutivas sucessivas e não necessariamente lineares que são favorecidas pelas experiências linguísticas, incluindo o aprendizado da leitura6. Em contrapartida, as unidades suprafonêmicas (ou suprassegmentais) como a sílaba e a rima já estão presentes espontaneamente entre os 4 e 5 anos. O desenvolvimento da consciência fonológica hoje é normalmente visto como ocorrendo ao longo de um continuum que se inicia com a consciência das unidades maiores ou mais superficiais, a começar pelas palavras, seguidas das sílabas, e, depois passando pelas unidades intrassilábicas como o ataque (onset) e a rima (rime) e, finalmente, chegando às unidades menores, os fonemas3,6.
Vários estudos desde a década de 1980 demonstram que a sensibilidade ao ataque (aliteração) e rima em crianças não leitoras de 3, 4 e 5 anos prediz o sucesso na aprendizagem da leitura até 3 a 4 anos depois da instrução formal, confirmando a relação de causa-efeito entre o treino fonológico durante a pré-escola e o desempenho na alfabetização – ambos contribuíram decisivamente para o uso largamente aceito do conceito de consciência fonológica (sensibilidade à aliteração e rima, e habilidade de segmentação fonêmica) em lugar de consciência fonêmica3. Finalmente, esses estudos mostram que as crianças em idade pré-escolar com um desempenho muito fraco nas tarefas de rima e aliteração são aquelas que apresentam o maior risco de dislexia nos anos escolares3. Finalmente, em 1982, Alegria, Pignot e Morais25 mostraram que o nível de consciência fonêmica também depende das abordagens ou métodos de ensino ao observarem que as crianças alfabetizadas no método fônico (ênfase no código) tiveram um desempenho quase quatro vezes superior ao daquelas alfabetizadas no método global (ênfase no significado) em tarefas de consciência fonêmica.
Na dislexia, o estabelecimento das relações letra-som e o reconhecimento preciso de palavras (leitura lexical) são prejudicados devido à fraca consciência fonêmica, o que leva a uma baixa fluência (velocidade de leitura medida pelo número de palavras lidas em 1 minuto) de leitura nos disléxicos, notadamente lenta e silabada, o que prejudica a compreensão do que está sendo lido. A lentificação da leitura nos disléxicos exige um tempo de retenção das palavras na memória de trabalho maior do que seria o normal para sua integração em frases, e se considerarmos que os disléxicos também apresentam déficits na memória de trabalho verbal (ou fonológica) estes se interagem com as dificuldades na conversão letra-som (também chamado de decodificação ou rota sublexical) prejudicando ainda mais a “automaticidade” da leitura, o que acaba interferindo na compreensão. Como notou Rayner e colegas10 em um dos mais importantes artigos de revisão da ciência psicolinguística publicado no renomado periódico Psychological Science, o processamento de todas as palavras do texto e o papel proeminente da decodificação grafo-fonológica na leitura dos leitores hábeis estão “entre os mais importantes achados da pesquisa contemporânea sobre a leitura e sugere fortemente que a aquisição das habilidades de leitura dependem em parte em aprender a usar a informação fonológica eficientemente” (p.48). Na realidade, todas as evidências empíricas, incluindo nossos estudos, bem como a experiência prática, indicam que a leitura global baseada no contexto e marcada por adivinhações, ao contrário do que prega a abordagem com ênfase no significado, é típica dos leitores fracos e dos disléxicos e não dos leitores hábeis10.
É importante ressaltar que as crianças disléxicas não apresentam dificuldades com aspectos da narrativa oral, porém, como elas comumente apresentam déficits de memória verbal de curto prazo, suas dificuldades aparecem na transposição ou reconto das histórias orais para as histórias escritas, nas quais necessitam de ajuda para organizar e sintetizar as ideias. Também é importante compreendermos que os prejuízos na leitura levam os disléxicos a terem dificuldades em tarefas aritméticas que exigem a leitura de enunciados bem como sequências algorítmicas baseadas em rótulos verbais em operações mais complexas. Nossa experiência mostra claramente que as crianças disléxicas normalmente possuem um excelente raciocínio numérico e matemático nos dois primeiros anos do ensino fundamental, mas começam a fracassar a partir do terceiro ou quarto ano ao serem introduzidas as operações aritméticas mais complexas5.
Estimulando a consciência fonológica

Vários estudos têm demonstrado3,5 que, além de as habilidades de rima e aliteração em idade pré-escolar serem excelentes preditoras da aquisição da linguagem escrita, bem como de crianças em provável grupo de risco de dislexia, atividades pedagógicas que trabalham essas habilidades de forma lúdica, intensa e sistematizada, têm um efeito altamente positivo na consciência fonêmica e na leitura e escrita nos primeiros anos escolares.
O treino das habilidades fonológicas ainda na educação infantil, através de jogos de linguagem, brincadeiras cantadas ou recitadas etc., é um tipo de intervenção precoce que, se não ajuda completamente, uma vez que o transtorno é uma condição vitalícia, minimiza bastante os efeitos posteriores que os alunos enfrentarão no período de alfabetização. Portanto, a escola pode escolher dois caminhos: o da intervenção remediativa, quando é feita após o diagnóstico, ou o da intervenção preventiva, quando a escola atua em atividades metafonológicas que contemplam todas as crianças antes mesmo de se ter um diagnóstico fechado de algumas delas. A essa postura preventiva também damos o nome de responsividade26.
Também há a possibilidade de se combinar esses dois tipos de intervenção. Aliás, enfatizamos que, para a escola atuar de forma preventiva, deve se concentrar muito mais na manifestação do que no diagnóstico, uma vez que este só será conclusivo, no caso da dislexia, após o término da alfabetização (por volta do fim da 2ª série ou atual 3° ano na nova nomenclatura do ensino fundamental). Somente após o diagnóstico, dizemos que a intervenção é remediativa.
Tabela 1. Estímulos da consciência fonológica

 ciranda- por Antonio-Poteiro

ciranda- por Antonio-Poteiro

Habilidades
Tarefas
Exemplos
RIMA
Produção
a) Brincadeiras envolvendo o nome de objetos ou pessoas.
Ex.: Gabriela rima com ____________. (panela, janela, Daniela)
Quem cochicha o rabo ____________. (espicha etc.)
Detecção e
Julgamento
a) Dizer se duas palavras (ou figuras) rimam ou não.
b) De três palavras (ou figuras) dizer qual a que não rima ou as duas que rimam.
ALITERAÇÃO
Produção
Fui a Portugal e na mala levei _____________. (estipular um único fonema e todos os objetos levados na mala devem começar com o mesmo som).
Detecção e
Julgamento
a) Dizer se duas palavras (ou figuras) começam com o mesmo som ou não.
b) De três palavras (ou figuras) dizer quais as duas que começam com o mesmo som ou qual é a diferente.
SEGMENTAÇÃO
SILÁBICA
a) Contar quantas sílabas (ou pedaços) as palavras têm.
b) Brincar com a língua do “pê”: pêga, pêto = gato.
c) Colocar ou adicionar sílabas para modificar as palavras. Ex.: Se eu tirar o “ga” da palavra galinha com o que eu fico? Se eu colocar o “sa” na frente da palavra pato, que nova palavra eu tenho?
SEGMENTAÇÃO
FONÊMICA
a) Detectar o fonema inicial: sapato / sa-pa-to / “ssssssssss”.
b) Identificar e agrupar palavras que comecem com o mesmo fonema. Ex.: separar todas as figuras que comecem com “ssssssssss” (sino, sapo, sabonete, cenoura).
c) Adivinhar palavras que comecem com um fonema produzido por um adulto: Estou pensando em palavras que começam com “ssssssssss”.
d) Sintetizar ou agrupar fonemas produzidos um a um. Que palavra posso formar se pronunciar esses sons juntos? V-a-c-a > vaca. Ou vice-versa, quantos sons posso ouvir na palavra tapete?
Estratégias realizadas durante o período de alfabetização também podem ajudar muito as crianças com risco de dislexia, dentre elas estão as que auxiliam a análise e síntese das palavras (quer nas categorias silábicas ou fonêmicas) uma vez que vimos que suas dificuldades não são no nível do texto, mas sim no nível da palavra. Outras estratégias para auxiliá-los no reconhecimento rápido poderão ser utilizadas, como por exemplo, fazer o levantamento das palavras desconhecidas ou menos regulares de um texto, levando o aluno a fazer análise da estrutura ortográfica (podendo fazer uso do dicionário ou do modelo oferecido pelo professor). Ensinar que determinados grafemas podem ser pronunciados por diferentes fonemas, de acordo com a posição que ocupam na palavra (ex.: a letra c pode ter o som de /s/ ou /k), organizar listas de palavras cuja categoria gramatical estabelece a regra, pois contam com morfemas derivacionais (prefixos, sufixos) e, portanto, auxiliam no armazenamento da palavra no léxico mental etc.
Também é de suma importância dar tempo necessário para o aluno com dislexia ler várias vezes o material escrito e, se possível, ler até com antecedência o texto que será utilizado em sala de aula, pois assim ele terá tempo necessário para entrar em contato com palavras mais difíceis ou que ainda não fazem parte do seu vocabulário. Outra característica marcante nos disléxicos são confusões com palavras fonologicamente parecidas, como plaquinha com pracinha, marceneiro com marinheiro, microfone com telefone, bem como confusões semânticas, como trocar lanterna por abajur, o verbo acender no lugar de apagar, entre outras. Também podem aparecer dificuldades para “evocar” as palavras, como se a palavra estivesse “na ponta da língua”, mas a criança não consegue acessá-la, acabando por descrever o objeto a que se refere, mas sem achar o seu nome. Portanto, jogos de linguagem, canções, histórias e brincadeiras que ampliam e estimulam o vocabulário devem ser amplamente exploradas na educação infantil e séries iniciais do ensino fundamental.

Considerações finais

Bratsa Bonifacho
No Brasil, o diagnóstico de transtornos de aprendizagem segue o modelo médico, ou seja, é feito por exclusão de sintomas. Nos últimos anos, pesquisadores brasileiros têm se esforçado e publicado modelos de avaliação adaptados para a ortografia do português brasileiro, gerando mais eficácia aos instrumentos de avaliação5. No entanto, ressaltamos que, para se fechar um diagnóstico de dislexia, deve-se contar com uma equipe multidisciplinar composta por diferentes profissionais, tanto da saúde como da educação. Como esse processo é lento e depende não só de aspectos do desenvolvimento da criança, mas também de sua escolaridade, quanto mais atuante e responsável for a escola ao promover estratégias de trabalho que incluam atividades com estimulação da linguagem oral, abrangendo seus aspectos fonológicos, sintáticos e pragmáticos, mais sólido será o aprendizado da língua escrita.
Com base em nossa experiência profissional, bem como em evidências científicas da área, incluindo nossos próprios estudos, afirmamos que muitos escolares que recebem a intervenção precoce na qual são reforçadas de forma sistemática as habilidades metafonológicas fundamentais para a aquisição da leitura escrita, saíram do grupo de risco porque apresentavam apenas dificuldades de aprendizagem e não transtornos, o que evitou seu encaminhamento desnecessário a profissionais especializados. Em contrapartida, com respeito às crianças que não responderam a um programa coletivo sistematizado em atividades metafonológicas, observou-se um aumento nas chances de pertencerem ao grupo de risco, fazendo-se necessário organizar um programa de intervenção específico e individual para essas crianças, tanto no nível escolar quanto clínico.
Por essa razão, é importante os professores estarem bem informados e formados nas questões metodológicas, pois estratégias escolares poderão ser úteis tanto na identificação, avaliação e intervenção em crianças passíveis de estarem em grupo de risco. O papel dos pais também é de grande relevância, tanto na estimulação dentro do seio familiar, como também na colaboração dentro das tarefas escolares. Ressaltamos que, quando existe uma verdadeira parceria entre pais, professores e profissionais clínicos, a chance de se inserir o aluno disléxico na escola e na sociedade é muito maior.

Referências
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3 thoughts on “Dislexia: quando aprender a ler não é uma aventura prazerosa – Olga Valéria C. A. Andrade, extraído do livro “Aprendizagem, comportamento e emoções na infância e na adolescência-uma visão transdisciplinar”- Elisabete Castelon Konkiewitz (Org.) editora UFGD, 2013.

  • 04/04/2016 em 20:42
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    Por favor aumentem a fonte e o espaçamento. Tenho dislexia e não consigo ler nada dessa forma. Obrigado.

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  • 18/12/2015 em 0:56
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    Matéria interessante sobre disfunções cerebrais. Gostaria que publicassem matéria sobre uma outra anomalia: T.D.A.H. Sou portador e, devido à esse transtorno, creio que seria interessante, tendo em vista que foi, é e será um problema que afeta uma grande parcela da humanidade.

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  • 13/05/2014 em 12:10
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    Excelente matéria. Sugiro uma sobre autismo e TDAH.
    Obrigado.

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