Dor na doença de Parkinson-por Jaquelyne Oliveira Silva e Pedro Fonseca Ferreira

Introdução

 

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Dor é um sintoma muito frequente na Doença de Parkinson (DP). Desde a primeira descrição (1817) por James Parkinson, já se fazia referência à “dor do tipo reumática” ipsilateral à extremidade afetada. Charcot, posteriormente, descreveu diferentes tipos de dor experienciados pelos pacientes com DP.

Os sintomas não motores nos pacientes com a doença de Parkinson são muito frequentes, podendo ser encontrados antes do aparecimento dos primeiros sintomas ou no decorrer do curso da doença, acarretando uma alteração na qualidade de vida e no grau de autonomia do paciente. Em muitos casos, o surgimento de sintomas não-motores são associados ao período off (Witjas et al.  2002).

Em um estudo realizado por D. Santos-García et al. (2011) com 159 portadores de DP, a dor foi o sintoma não-motor mais frequentemente relatado, acometendo 72,3 % dos pacientes. Já Beiske et al (2009) encontrou uma prevalencia de dor  em pacientes com DP de 83%.

 

Classificação e Fisiopatologia da Dor

 

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A dor da DP tem ainda origem incerta. Alguns estudiosos acreditam que ela é de origem primária, decorrente de alterações do próprio sistema nervoso central (SNC) subjacentes à própria progressão da doença, outros, por sua vez, defendem que a dor seria um componente secundário da DP, que surgiria como complicação de outros sintomas, como rigidez, discinesias e distonias.

Frequentemente depara-se no cotidiano clínico com pacientes portadores de dores de diferentes tipos, o que reforça a ideia de que a dor na DP tem, na verdade, etiologias diversas.

Muitos autores tentaram classificar e descrever os diferentes tipos de dor e seus mecanismos.

Segundo Ford, existem na DP cinco diferentes tipos de dor. A dor músculo-esquelética está diretamente relacionada com rigidez, deformidades, e causas reumatológicas, surge desde os estágios iniciais da doença, e manifesta-se preferencialmente como dor nas costas, no pescoço, nos ombros e nas pernas, estando presente sobretudo no hemicorpo com maior acometimento motor. Para este tipo de dor, estaria indicado um esquema de tratamento dopaminérgico.

A dor radicular neuropática, por sua vez, apresenta uma distribuição dermatomérica em relação a uma radiculopatia, ou distribuição periférica nos casos de mononeuropatias ou polineuropatias. A causa mais frequente, entretanto, não se associa diretamente à doença de Parkinson, mas seria resultado de compressão radicular; o tratamento indicado nesse caso seria o tratamento clássico para dor neuropática.

 

 

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A dor neuropática central apresenta-se como queimação e compressão difusas e não é um tipo de dor específico da DP. Uma das prováveis etiologias seria uma alteração do processamento central da dor como parte do processo neurodegenerativo, em que haveria perda das aferências dopaminérgicas descendentes, resultando da perda de neurônios dopaminérgicos na área tegmental ventral (TVA) e substância nigra (NS). Essa desnervação dopaminérgica acarretaria em uma hipersensibilidade central aos estímulos dolorosos através das conexões entre os gânglios da base e o tálamo. Além disso, a degeneração de células noradrenérgicas do Locus Ceruleus (LC) também altera a inibição descendente da das vias nociceptivas do corno dorsal da medula. Esse tipo de dor apresenta íntima relação com as flutuações motoras, aparecendo, principalmente em situações off.

 

 

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A dor distônica é localizada na extremidade onde o paciente apresenta distonia – perna, pescoço e braço. Também apresenta surgimento preferencial em situações off. A terapêutica teria enfoque no controle da distonia – aumentar a estimulação dopaminérgica em situação off. Um tratamento alternativo para casos refratários desse tipo de dor consistiria na aplicação de toxina botulínica.

Nessa classificação ainda foi descrita a dor acatísica, decorrente de acatisia.

 

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Outra classificação também bastante difundida foi proposta por Quinn et al. (1986), que divide a dor da DP em quatro tipos:  a dor que precede o diagnóstico da DP; a dor do período off, que é a mais frequente nos pacientes com flutuações motoras e está associada a outros sintomas não-motores, ocorrendo principalmente em pernas, abdôme e região lombar, com predomínio no período da manhã. Esta dor diminui ou é suprimida depois da primeira dose de L-dopa, e por isso, o tratamento consiste em reduzir ou evitar a ocorrência de períodos off. Há também espasmos distônicos dolorosos e ainda a dor de pico de dose, associada às discinesias graves e que melhora quando se fracionam as doses de L–dopa , consequentemente, as discinesias.

 

Diagnóstico

 

O diagnóstico da dor na DP parte da confirmação da relação entre a apresentação dolorosa e a DP. Portanto, nesse sentido, torna-se de importância singular descartar a presença de comorbidades associadas que geram dor.

A importância do estabelecimento de um diagnóstico de dor decorrente da DP reside no fato de que um tratamento pode ser ineficaz e/ou mal indicado quando não há acurácia desse diagnóstico.

Assim, nota-se a necessidade de aplicação de um questionário quanto à dor e a outros sintomas não-motores associados nos pacientes com DP. Dentre os questionários mais utilizados, pode-se citar o Brief Pain inventory (BPI) e o Medical Outcomes Study 36-Item Short Form (SF-36).

A discussão sobre o diagnóstico acurado da dor na DP torna-se bastante importante, quando se percebe que este é um sintoma subdiagnosticado, subvalorizado, sendo sempre muito baixo o percentual de pacientes que recebem tratamento adequado.

Dentre os fatores fundamentais que ajudam a reconhecer que a dor se relaciona à DP são: apresentação da dor ou sua maior intensidade no lado mais afetado pela enfermidade e a melhora ao tratamento dopaminérgico.

Outra importante ferramenta para verificar a relação entre o sintoma e DP é solicitar ao paciente que faça um diário em que anote os períodos de dor e de outros sintomas não-motores, para ver se coincidem com os períodos off.

É necessário realizar em todo paciente com DP e dor uma exploração neurológica geral e minunciosa para descartar outras possíveis patologias.

 

Tratamento farmacológico

 

            A terapêutica da dor na DP deve ser estabelecida segundo o tipo de dor que acomete o paciente. Nos casos de dor associada à DP, comumente utilizam-se L-dopa e agonistas dopaminérgicos, além dos inibidores da monoaminooxidase-B (IMAO-B) e inibidores da catecol-O-metil transferase (ICOMT). Na dor distônica e neuropática central o tratamento de escolha é  a levodopa com taxa de resposta entre 37 e 40% dos casos (Beiske AG et al., 2009). Na dor músculo-esquelética o tratamento também é dopaminérgico, porém com resposta menos satisfatória (apenas 17% dos casos segundo Beiske AG et al., 2009).

Nos casos em que o tratamento dopaminérgico é insuficiente, medicamentos antidepressivos tricíclicos (ADT) podem ser associados (Sandyk R, 1986). Já naqueles casos em que há associação com sintomas sensitivos, fármacos anticonvulsivantes como gabapentina ou pregabalina podem ser implementados (Vela L, 2006). O uso de anti-inflamatórios não-esteroidais (AINEs), analgésicos e opióides pode ser empregado se necessário. E, nos casos refratários, os derivados da morfina podem aliviar a dor num curto prazo, mas com risco acentuar o parkinsonismo e de tolerância.

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A fisioterapia, tendo como metas o alongamento muscular, a melhora da rigidez, da postura e do equilíbrio, além do aprendizado de técnicas de relaxamento, pode ter um grande impacto no alívio da dor e na qualidade de vida dos pacientes com a DP. Cabe ressaltar o papel da música durante as atividades físicas sob a forma de dança e durante sessões de relaxamento. O ritmo da música fornece ao cérebro um estímulo externo que possibilita ao paciente romper com a sua inibição motora, de modo que o ritmo guia e liberta os seus movimentos.

 

 

 

 

parkinson9A música  também faz com que o cérebro libere endorfinas, que são substâncias associadas ao prazer e à inibição da dor. Além disso, a atenção, que é um componente importante na experiência dolorosa, se desloca para o estímulo musical e a atividade a ele associada.

 

Tratamento cirúrgico

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Uma importante intervenção cirúrgica que tem sido amplamente utilizada como tentativa de tratamento para a DP é a estimulação cerebral profunda do núcleo subtalâmico, que mostrou-se bastante promissora no alívio da dor distônica off (100%), central (92%), radicular neuropática (63%), músculo-esquelética (61%).

Essa melhora poderia ser explicada devido à atenuação dos sintomas motores off (dor distônica off e músculo-esquelética) e pela alteração do processamento da dor nos gânglios basais nos casos de dor central.

 

 

 

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Jaquelyne Oliveira Silva e Pedro Fonseca Ferreira-graduandos da XIIa turma do curso de Medicina-UFGD

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Referências

  1. BEISKE, A.G. et al. Pain in Parkinson’s disease: Prevalence and characteristics. Pain, v. 141, p. 173-177, 2009.
  2. ERRO, M. E.; MORENO, M. P.; ZANDIO, B. Bases fisiopatológicas de los síntomas no motores de la enfermedad de Parkinson. Rev. Neurol., v.50, p. 7-13, 2010.
  3. GARCÍA, D.S. et al. Dolor en la enfermedad de Parkinson: prevalencia, características, factores asociados y relación con otros síntomas no motores, calidad de vida, autonomia y sobrecarga del cuidador. Rev. Neurol.,v. 52, p. 385-393,  2011;
  4. HARADA, T.; TODA, K. Prevalence, classification, and Etiology of Pain in Parkinson’s Disease: Association between Parkinson’s Disease and Fibromyalgia or Chronic Widespread Pain. Tohoku J. Exp. Med., v. 222, p. 1-5, 2010.
  5. Mc DONALD, L. M. et al. Deep brain stimulation of the subthalamic nucleus improves sense of well-being in Parkinson’s disease. Mov. Disord., v. 27, p. 372-378, 2012.
  6. MOLNAR, G.F. et al.Differences in Neuronal Firing Rates in Pallidal and Cerebellar Receiving Areas of Thalamus in Patients With Parkinson’s Disease, Essential Tremor, and Pain. J. Neurophysiol., v. 93, p. 3094-3101, 2005
  7. MOTT, S. et al. Pain as a sequela of Parkinson disease. Reprinted from Australian Family Physician, v. 33,nº 8, 2004.
  8. SANTOS-GARCÍA, D. et al. Síntomas sensoriales en la enfermedad de Parkinson. Rev. Neurol., v.50, p. 65-74, 2010.
  9. SEVILLANO-GARCÍA, M. D.; MANSO-CALDERÓN, R. Síntomas no motores en la enfermedad de Parkinson y estimulación cerebral profunda. Rev.  Neurol., v.50, p. 95-104, 2010.
  10. SKOGAR, O. et al. Parkinson’s disease patients’ subjective  descriptions of characteristics of chronic pain,  sleeping patterns and health-related quality of life. Neuropsychiatric Disease and Treatment, v. 8, 2012.
  11. TINAZZI, M. et al. Pain and motor complications in Parkinson’s disease. Journal Neurol Neurosurg Psychiatry, v. 77, p. 822-825, 2006.
  12. TRUINI, A.; FRONTONI, M.; CRUCCU, G.Parkinson’s disease related pain: a review of recent findings. J. Neurol., v. 260, p. 330-334, 2013.
  13. WEN, H. B. Epidemiology and Clinical Phenomenology for Parkinson Disease with Pain and Fatigue.  Parkinsonism Relat. Disord., v. 18, p. 222-225,2012.

 

 

16 thoughts on “Dor na doença de Parkinson-por Jaquelyne Oliveira Silva e Pedro Fonseca Ferreira

  • 25/04/2022 em 20:31
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    DP e Distonia é a mesma coisa?

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  • 25/04/2022 em 20:28
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    meu genro tem distonia .sente dores o tempo todo os remédios não faz efeitos agora esta engasgando muito ,já afetou também os olhos ,não sabemos mais o q fazer . será que fisioterapia daria a ele uma qualidade de vida melhor?

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  • 09/12/2020 em 15:34
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    Meu marido tem Parkinson e consegue pegar vários medicamentos na associação de Parkinson em Curitiba, isso ajuda muito.
    Precisamos de mais informações sobre qualidade de vida para os pacientes, compartilhem.

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  • 30/10/2019 em 12:41
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    bom dia tenho DP a 3 anos e de coluna a 8 anos tenho dor na perna esquerda formigamento bastante na direita tenho mais pouco ainda o meu medico quer operar a coluna estou em duvida nao sei oque fazer esta tudo confuso

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    • 19/04/2020 em 20:04
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      Boa tarde, Luiz Carlos!
      Eu sinceramente, acredito que é melhor você fazer Fisioterapia e tomar os medicamentos de Parkinson direitinho, pois, levei meu pai a um médico que tem Doutorado em Parkinson da UFRJ em Copacabana no ano de 2008, ele afirmou que essa doença dá pequenos sinais de sua existência, anos antes, de seu diagnóstico, de repente, você acredita que é sua coluna, mas já era o Parkinson chegando ao seu organismo há 8 anos atrás.
      Desculpe-me a sinceridade, mas tenta reavaliar isso direito, ok!
      Tem médicos e médicos, assim como, tem profissionais e profissionais de várias áreas. Tenta ver melhor isso, analise com paciência se vale a pena operar, porque com meu pai foi a mesma coisa, no início da doença… um médico queria operá-lo.
      Boa sorte em sua luta, você vai vencer, ok!
      Meu pai está há quase 18 anos com Doença de Parkinson, continua andando, não está acamado e nem usa cadeira de rodas. Porém, leio muito sobre a doença, venho lendo durante todos esses anos e buscando alternativas de alimentação, exercícios, etc.
      Abraços

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  • 11/02/2018 em 0:22
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    Tenho parkson há 15 anos, minhas pernas estão travando mto, uso prolopas 200+50 de 3 em 3 HS o q tomo em jejum parece q faz mas efeito . Comecei aos 43 anos estou com 58. Q fazer me sinto desanimada.

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  • 03/11/2017 em 17:15
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    Boa Tarde a todos, Meu irmao tambem tem parkson fazem 20 anos . desde os 50 anos. ele fez cirurgia pelo sus no hospital brigadeiro em sao paulo, foi muito bom deu qualidade de vida. vai a dica pra vcs .

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  • 25/05/2017 em 13:49
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    meu nome é donisete, tenho 52 anos e sou portador de DP diagnosticada a 6 anos. faço tratameno com prolopa 200/50, selegilina, stabil, sertralina para a depressão e rivotril. sinto muitas dores pelo lado esquerdo do corpo, onde tenho a DP. que tratamento é mais indicado para aliviar essa dores.

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  • 17/07/2016 em 22:45
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    Meu marido tem 50 anos e há 5 anos foi diagnosticado com a Doença de Parkinson. Ele tem mt dor, quase não aguenta, mt forte as dores principalmente do lado esquerdo que foi o lado mais afetado. Ele faz uso de Prolopa 200/50 de 3 em 3 horas meio comp. e pramipexol 0,25 mg duas vezes ao dia. Gostaria de saber qual sobre o DBS, ele quer fazer o implante de eletroudo para diminuir as dores. Qual hospital faz essa cirurgia? ou só existe particular.

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    • 03/11/2017 em 17:17
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      tente o hospital brigadeiro de sao paulo, meu irmao fez a cirurgia tudo pelo sus, a equipe e muito boa todos os exames sao feitos la. deu qualidade de vida pra ele

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  • 16/05/2016 em 19:56
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    Muito bom este conteúdo!
    Precisamos ajudar na divulgação da doença de Parkinson.
    Este post informa sobre os 10 principais sintomas de parkinson:

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  • 05/06/2015 em 17:27
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    Sou portador de D P. Tenho 50 anos. Faco fizioterapia, tomo Mantidan 100mg. Prolopa 100/25mg. Diazepan 5mg, pois nao durmo quase nada. Meu Medico ja me deu dois laudos. E ao passar pelo perito do inss, o mesmo nao consedeu meu beneficio. E tenho pago minha autonomia em dia. Levei tambem, o laudo da minha fizioterapia e de nada adiantou. O que devo fazer?.

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    • 30/10/2017 em 21:50
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      Procurar a defensoria pública da união.
      DPU ,para recorrer da decisão do INSS

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  • 04/02/2015 em 8:26
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    Adorei muito,infelizmente não encontro esses medicamentos no meu país (Angola)com conseguir? Existem farmácias on-line? Quais?

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