PROCESSAMENTO VISUAL DE NÍVEL SUPERIOR (parte 3)- por Carla Geórgia Rodrigues Guimarães Souto Diego Fleury de Lemos Pereira

A visão não é um mecanismo de transmissão de informação reunindo formas em etapas, com complexidade crescente. Os processos subjacentes são altamente dinâmicos. As estratégias para interpretar a imagem envolvem circuitos corticais dependentes de experiência, em que informações são constantemente armazenadas acerca das formas de objetos observadas pelo individuo ao longo da vida.

PRESERVED acuity, brightness discrimination, color vision, & other elementary visual capabilities. Sometimes preserved shape from motion. SEVERELY IMPAIRED form perception (pictures, letters, simple shapes, objects) They do not have memory problems or dementia, they have knowledge of the objects. How to test Allowing patient to touch the object can help differentiate between a visual disorder vs. a deficit at the level of object knowledge.

O processamento visual de nível superior integra informações de uma variedade de fontes variadas e é o estágio final na via visual, conduzindo a experiência visual consciente. Ele depende de sinais descendentes que integram representações sensoriais ascendentes com significado semântico, como decorrentes da memória de trabalho de curto prazo, memória de longo prazo e objetivos comportamentais, portanto, seleciona atributos comportamentais significativos do ambiente visual.

A experiência visual do mundo é fundamentalmente centrada no objeto, seres animados também são objetos para o sistema visual e eles são muitas vezes visualmente complexos, com grande número de características visuais conjugadas. Os objetos também são associados a experiências específicas como: outros objetos lembrados, outras sensações (como som, aroma ou perfume e outras emoções) permitem o indivíduo agir com base nas informações visuais. A percepção do objeto é então, o nexo entre a visão e a cognição.

O córtex temporal inferior (CTI) é uma grande região do cérebro, os padrões de conexões anatômicas que partem ou chegam a ele indicam que essa região compreende pelo menos duas subdivisões funcionais: CTI anterior e posterior, segundo evidências anatômicas a porção anterior possui um estágio de maior processamento do que a subdivisão posterior, sendo assim o principal centro para a percepção de objetos. O tipo específico de perda visual do reconhecimento de objetos é conhecida como agnosia visual (“sem conhecimento visual”), termo cunhado por Sigmund Freud. Em humanos há duas categorias de agnosia visual; aperceptiva quando a capacidade de copiar ou combinar formas visuais ou objetos está prejudicada e associativa, quando se pode copiar ou combinar objetos complexos, mas a capacidade de identifica-los está prejudicada.

The fusiform face area (FFA) is a part of the human visual system which might be specialized for facial recognition, although there is some evidence that it also processes categorical information about other objects, particularly familiar ones.
https://littlegreymatters.com/tag/prosopagnosia/

Os neurônios no CTI codificam estímulos visuais complexos. Na verdade, várias subpopulações de neurônios codificam objetos que transmitem ao observador informação altamente significativa, como faces e mãos. Para células que respondem a visão de uma mão, cada dedo é importante. Entre as células que respondem a faces, o estímulo mais eficaz para algumas células é a visão frontal, para outras é a visão lateral, apesar de alguns neurônios responderem preferencialmente a rostos, outros respondem a expressões faciais. A incapacidade humana de reconhecimento facial é uma forma de agnosia associativa conhecida como prosopagnosia, resulta de lesão em uma pequena região do lobo temporal; agnosia específica pode acontecer com tipos variados como frutas, ferramentas, vegetais, seres vivos ou animais. Esses neurônios por sua vez são funcionalmente organizados em colunas, formando aglomerados celulares organizados de acordo com a função de cada uma. Estas colunas no CTI são organizadas de tal modo que estímulos diferentes que possuem algumas características semelhantes são representados em colunas parcialmente sobrepostas.

Model of face processing. Damage to posterior regions of the inferior occipito-temporal cortex can result in difficulties with early perceptual encoding and perceptual encoding of static structure, resulting in apperceptive prosopagnosia (blue). Damage to the anterior inferior temporal cortex can result in difficulties retrieving face memories, or linking static structure to the memory of faces (red). Meanwhile, damage to the anterior temporal pole can result in difficulties with biographical information which results in person-specific amnesia (green). 
https://www.researchgate.net/figure/Model-of-face-processing-Damage-to-posterior-regions-of-the-inferior-occipito-temporal_fig1_259586385

O córtex pré-frontal é cada vez mais reconhecido como importante contribuinte para a visão de nível superior, pois a segunda grande projeção do CTI dá-se para ele, entre as projeções principais estão as que se dirigem ao córtex perirrinal e ao córtex para-hipocampal, que se encontram do lado medial da superfície ventral do CTI. O CTI também fornece aferências – direta e indiretamente através do córtex perirrinal – para a amígdala, que parece dar valência emocional a estímulos sensoriais e abranger componentes cognitivos e viscerais da emoção. Finalmente, o CTI é a principal fonte de aferências para áreas sensoriais multimodais do córtex, como a área temporal superior polissensorial.

A constância de percepção (CP) ou constância perceptiva é a capacidade de reconhecer objetos como sendo os mesmos em diferentes condições de visualização e é um dos requisitos funcionalmente mais importantes da experiência visual. Os sinais da identidade e do significado dos objetos são os atributos invariantes desse objeto, como características de imagens ou seus elementos típicos, como as listras das zebras. A CP tem muitas formas e simplifica o comportamento, pois reconhecer que um objeto tem tamanhos semelhantes mesmo a distâncias diferentes caracteriza a constância de tamanho; reconhecer um objeto como igual independente de sua posição, a constância de posição; invariância de forma refere-se à constância de uma forma quando os sinais que a definem mudam; invariância na perspectiva visual refere-se a CP de objetos tridimensionais observados a partir de diferentes ângulos. Assim, a invariância na perspectiva visual pode ser alcançada em estágio superior de processamento cortical, como o córtex pré-frontal, por aferências convergentes de neurônios seletivos para perspectivas específicas.

A percepção categórica (PC) também simplifica o comportamento, pois é a capacidade de distinguir objetos de diferentes categorias, mesmos quando objetos da mesma categoria não podem ser distinguidos. A PC reflete a sensibilidade a atributos visuais invariantes, como por exemplo a marca de uma cadeira que é oferecida para que alguém se sente.

A experiência visual pode ser armazenada como memória e a memória visual influência o processamento da informação visual recebida. O reconhecimento de objetos, baseia-se nas experiências anteriores do observador com esses objetos, então as contribuições do CTI para o reconhecimento devem ser mutáveis pela experiência. Devido a isso, o sistema visual desenvolve dois tipos de plasticidade, um decorre da exposição repetida ou prática, o que leva a melhorias na discriminação visual e na habilidade de reconhecimento de objetos, constituindo uma forma de aprendizado implícito conhecido como aprendizado perceptivo; o outro tipo ocorre em conexão com o armazenamento de aprendizado explícito, o de fatos ou eventos que podem ser lembrados conscientemente. No CTI a seletividade neuronal para objetos complexos pode sofrer alterações que são paralelas a mudanças na capacidade de distinguir objetos, sendo manifestada muitas vezes como um aperfeiçoamento da seletividade ao estímulo em vez de mudanças na frequência absoluta de disparo.

O aprendizado visual explícito depende da ligação entre o sistema visual e a formação da memória declarativa. A memória de trabalho, tem uma capacidade limitada, a informação visual sensorial se mantém na memória de trabalho a curto prazo através da atividade neuronal durante os intervalos anteriores às respostas emitidas em uma tarefa visual, quando neurônios nos córtices TI e pré-frontal continuam disparando potenciais de ação. As atividades nos córtices diferem durante esse intervalo em diversas maneiras. Neurônios no CPF inicialmente, codificam as propriedades sensoriais do objeto, mas em seguida começam a codificar uma associação com o que se espera ver, essa perspectiva no CPF pode ser a fonte de sinais descendentes para o CTI, ativando os neurônios que representam o que se espera ver, dando origem a memória consciente desse objeto. As mudanças dependentes de aprendizado na seletividade de estímulo nos neurônios do CTI são de longa duração, sugerindo que essa região cortical faça parte do circuito neural de memórias associativas visuais.

Movimentos oculares sacádicos (MOS), ou seja, grandes movimentos oculares que direcionam a fóvea de um objeto para outro, levam a alta resolução da fóvea a escrutinar as diferentes regiões do campo visual; sem tais movimentos, isso só seria possível com movimentos da cabeça ou do corpo. Eles podem ocorrer várias vezes por segundo, e cada período entre as fixações da visão dura várias centenas de milissegundos. A imagem da fóvea muda com cada movimento ocular, e ainda assim, um mundo visual estável pode ser percebido.

A atenção parece ser concentrada em apenas certos fragmentos da cena e não em todos os seus elementos, essa atenção seletiva visual depende dos MOS que trazem as imagens de partes desejadas do campo visual para a fóvea. Existem dois tipos de atenção: involuntária(exógena) ou ascendente e voluntária(endógena) ou descendente. Um exemplo de atenção voluntária é a leitura de uma página e de atenção involuntária o desvio da página pelo aparecimento repentino de uma forte luz.

No lobo parietal (LP) está implícito o processo da atenção visual (AV). Pacientes com lesões no LP direito tem campos visuais normais quando sua percepção é estudada por um estímulo único em um mundo visual simples, no entanto, quando é apresentado um mundo mais complicado, com objetos nos hemicampos visuais direito (ipsilateral) e esquerdo (contralateral), eles tendem a relatar mais sobre o que está no hemicampo visual direito. Este é um déficit conhecido como síndrome de negligência, surge porque a atenção está focada no hemicampo visual ipsilateral à lesão.

Cenas visuais permanecem estáveis apesar das mudanças contínuas na imagem na retina, a base dessa estabilidade não é compreendida, mas mudanças na percepção no momento de um MOS deixam pistas de que os objetos na cena percebida não têm exatamente o mesmo arranjo espacial que no campo visual. A cena parece comprimida de forma que estímulos apresentados pouco antes do MOS parecem mais perto do ponto de fixação anterior ao movimento, enquanto estímulos apresentados após o MOS parecem estar mais próximos do alvo do movimento. Neurônios no córtex parietal (CP) alteram suas atividades anteriormente ao MOS. Quando se está prestes a fazer um MOS, um neurônio torna-se menos sensível ao estímulo já presente em seu campo receptivo e começa a responder a estímulos que estarão dentro do campo receptivo após o MOS. Após o MOS, o neurônio é novamente ativado apenas pelos estímulos que estão, de fato, dentro de seu campo receptivo.

Durante um MOS, a cena visual é deslocada e varrida rapidamente em toda a retina, já que o olho se move a alta velocidade. Um objeto pode ser visto durante esse movimento movendo-se tão rápido quanto o olho e na mesma direção. Pode ocorrer que muito da cena visual é embaçado pela velocidade do movimento dos olhos e a imagem desfocada não chega à consciência. Assim, a redução da sensibilidade durante o MOS, conhecida como supressão sacádica, é específica para grades de baixa frequência. Tanto o mascaramento quanto a descarga corolária devem agir em conjunto para produzir a supressão sacádica que geralmente elimina o movimento intrusivo de cena durante os MOS.

Quando o movimento do olho varre o campo visual e o estímulo percorre toda a retina, os neurônios não respondem, mas quando o estímulo é movido com a mesma velocidade, em frente ao olho parado, esses mesmos neurônios disparam intensamente.

A visão interage com os sistemas suplementar e pré-motor para preparar as mãos para a ação. Se for para pegar um objeto, a mão ou os dedos se ajustam ao tamanho do objeto, a sua largura; se for para colocar o objeto em alguma fenda ou encaixa-lo em um local, as mãos também se ajustam, inclinam, como se fosse calculado antes de exercer o movimento adequado e necessário. Pacientes com lesão no CP não podem ajustar a extensão da abertura entre os dedos para a preensão ou o ângulo do punho pelo uso da informação visual, ainda que possam descrever verbalmente o tamanho de um objeto ou a orientação da abertura. Por outro lado, pacientes com lobos parietais intactos e déficits na via ventral não podem descrever o tamanho do objeto ou sua orientação, mas podem ajustar abertura entre os dedos e orientar suas mãos, assim como indivíduos normais. Neurônios no CP fornecem a informação visual necessária para a realização de movimentos independentes.

O córtex intraparietal anterior tem neurônios que sinalizam o tamanho, a profundidade e a orientação de objetos que podem ser apanhados. Esses neurônios respondem a estímulos que poderiam ser os alvos para o movimento de agarrar. Da mesma forma, os neurônios do córtex medial intraparietal representam os alvos para movimentos de alcançar objetos e projetam-se para a área frontal que gera o sinal pré motor para esses movimentos. A área intraparietal ventral tem neurônios bimodais que respondem a estímulos táteis e visuais na face. Essa área projeta-se para a área da face no córtex pré-motor. Os neurônios na área intraparietal lateral descrevem as metas dos MOS e projetam-se para o campo ocular frontal. Finalizando assim as informações visuais que são conduzidas ao cérebro através dos olhos, que estão em constante movimento, mas através deles mecanismos são ativados para cancelarem qualquer prejuízo por conta desses movimentos e ainda conduz informações que coordenam nosso sistema motor.

Referências

  1. Huff T, et al. Neuroanatomy, Visual Cortex. PLOS, 2018.
  2. Changes of cone photoreceptor mosaicin autosomal recessive bestrophinopathy. 2018.
  3. Deep learning based detection of cone with multimodal adaptive optics. 2018.
  4. Functional photoreceptor loss revealed with adaptive optics: An alternate cause of color blindness. J Carroll. 2004.
  5. Tratado de oftalmologia do Conselho Brasileiro de Oftalmologia. 2015.
  6. Eiber et al. Receptive Field Properties of Koniocellular On/Off Neurons in the Lateral Geniculate Nucleus of Marmoset Monkeys. J Neurosci. 2018.
  7.  Chica MG, Schneider KA. Hemispheric asymmetries in the orientation and location of the lateral geniculate nucleus in dyslexia. Wiley online library. 2017.
  8.  Brodmann K. Vergleichende Lokalisationslehre der Grosshirnrinde. Leipzig: Johann Ambrosius Bart, 1909.
  9.  Astudillo et al. Emotional Content Modulates Attentional Visual Orientation During Free Viewing of Natural Images. Front Hum Neurosci. 2018.
  10.  Principios de neurociências, Kandel. 2014.
  11.  Cem bilhões de neurônios, Lent. 2013.

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