Neuroplasticidade e seu Impacto na Aprendizagem

Glaucio Aranha

O termo neuroplasticidade se refere à sua capacidade do sistema nervoso de se reorganizar, formar novas conexões sinápticas e até mesmo gerar novos neurônios ao longo da vida. Este fenômeno e muito importante para o desenvolvimento e a adaptação humana. Compreender e aplicar os princípios da neuroplasticidade pode auxiliar no desenvolvimento de métodos e estratégias de ensino, promovendo uma aprendizagem mais eficaz e duradoura.

Entendendo a Neuroplasticidade

A neuroplasticidade desafia a noção do senso comum de que o cérebro é estático e imutável após certo ponto do desenvolvimento. Na verdade, há duas confusões nesse entendimento: o primeiro em tomar o cérebro por todo o sistema nervoso e o segundo em compreendê-lo como um órgão estático. Então, pondo alguns pingos nos is: o cérebro é um órgão do sistema nervoso, sendo a parte mais complexa do sistema, responsável pelo controle cognitivo, regulação emocional, percepção sensorial, funções motoras manutenção de funções autônomas etc. Já o sistema nervoso, em si, vai além do cérebro, incluindo a medula espinhal, formando o que denominamos Sistema Nervoso Central (SNC), que tem como um todo a responsabilidade pela sistemas autônomos e somáticos.

Compreender a neuroplasticidade como um fenômeno dinâmico, significa entender o SNC – e não só o cérebro – é dinâmico, ou seja, é capaz de mudar e se reorganizar em resposta a experiências, aprendizado e até mesmo lesões. Desde a primeira infância até a velhice, o SNC humano mantém essa capacidade de adaptação, o que é particularmente pronunciado em períodos críticos de desenvolvimento.

A Neuroplasticidade na Educação

Trazer o conceito de neuroplasticidade para pensar a aprendizagem em contexto educacional significa adotar uma abordagem para otimizar o ensino no sentido de compreender o sujeito como uma unidade biopsicossocial. Tradicionalmente, as estratégias e métodos pedagógicos tendem a encarar mais os aspectos psicossociais, não considerando as condições biológicas que atravessam o corpo de quem está na situação de aprendiz. Estudos recentes indicam que métodos pedagógicos que estimulam diferentes áreas cerebrais podem melhorar significativamente o processo de aprendizagem. Por exemplo, práticas repetidas, envolvimento ativo e experiências emocionais já foram analisados e avaliados como mais eficazes na promoção da neuroplasticidade, impactando sobre a aprendizagem; entendida como um processo relativamente permanente de mudança no comportamento ou no potencial de comportamento de um indivíduo, resultante de uma experiência ou prática.

Estudo publicados em periódicos científicos demonstram, por exemplo, que ambientes de aprendizagem enriquecidos, que oferecem uma variedade de estímulos e oportunidades para resolução de problemas, aumentam a densidade sináptica em áreas específicas do cérebro. Esses achados sugerem que técnicas pedagógicas inovadoras podem ser desenvolvidas para explorar essa capacidade adaptativa do cérebro. E neste sentido temos pesquisas bastante sólidas sendo desenvolvidas há décadas.

Em 1964, Marian Diamond e colaboradores já revelavam que ratos criados em ambientes enriquecidos apresentavam um aumento na espessura do córtex cerebral e na densidade sináptica em comparação com ratos criados em ambientes empobrecidos. Em 1973, Greenough & Volkmar mostraram que ratos criados em ambientes complexos tinham maior arborização dendrítica e maior densidade sináptica no córtex occipital em comparação com ratos criados em ambientes padrão.

Ao longo do tempo, esses estudos preliminares passaram a ser aplicados em contextos humanos com resultados que reforçavam estas mesmas descobertas em nossa espécie. Kolb e Whishaw, em 1998, publicaram uma revisão de literatura bem rica discutindo vários estudos que exploram como a exposição a ambientes enriquecidos pode levar a mudanças na estrutura do cérebro, incluindo aumentos na densidade sináptica e modificações na morfologia dos neurônios. Somam-se a este muitos outros estudos publicados nas últimas décadas em importantes revistas científicas, como a Nature Reviws Neuroscience e outras.

A relação entre a neuroplasticidade e a aprendizagem abrange variados aspectos. Amaral e Guerra (2020) desenvolveram um infográfico (abaixo) através do qual tentam ilustrar alguns deles.

(Para baixar o PDF do infográfico abaixo, clique aqui)

Técnicas Pedagógicas e Exemplos Práticos

Para aplicar os princípios da neuroplasticidade em práticas educacionais, várias estratégias podem ser implementadas na sala de aula ou contextos similares:

  1. Ensino Multissensorial: Abordagens que envolvem múltiplos sentidos podem reforçar a aprendizagem de maneira significativa. Atividades que combinam estímulos visuais, auditivos e cinestésicos ajudam a criar memórias mais robustas e duradouras.
  2. Aprendizagem Colaborativa: Promover o trabalho em grupo e a colaboração entre os alunos estimula áreas do cérebro associadas à empatia e comunicação, fortalecendo as redes neurais envolvidas nesses processos.
  3. Feedback Imediato: Oferecer feedback imediato e construtivo permite que os alunos corrijam seus erros e ajustem suas abordagens rapidamente, facilitando a formação de novas conexões neurais.
  4. Variedade de Estímulos: Alternar entre diferentes tipos de atividades, como leitura, discussão, prática e experimentação, mantém o cérebro engajado e promove a plasticidade neural.

A adoção de estratégias pedagógicas baseadas na neuroplasticidade é um convite para educadores explorarem novos horizontes, criando ambientes de aprendizagem dinâmicos e enriquecedores que fomentem o desenvolvimento cognitivo e emocional dos alunos.

Há muitas formas dessa convergência ser trabalhada, por exemplo, para aprimorar estratégias de ensino e aprendizagem, especialmente para alunos com dificuldades de aprendizagem. Programas de intervenção precoce, como o treinamento cognitivo e o uso de jogos educativos, podem ajudar a fortalecer as conexões neurais relacionadas à leitura, escrita e aritmética. Estudos mostram que exercícios específicos de leitura podem aumentar a conectividade entre regiões cerebrais envolvidas na decodificação de palavras e na compreensão do texto, melhorando significativamente o desempenho de alunos com dislexia e outros quadros (Doidge, 2007; Merzenich, 2013; Kolb & Whishaw, 2015). Esses programas utilizam a plasticidade do cérebro para remodelar e reforçar circuitos neurais, promovendo uma aprendizagem mais eficaz.

Além disso, a compreensão da neuroplasticidade pode transformar a abordagem pedagógica adotada pelos educadores. Ao reconhecer que o SNC dos alunos é altamente adaptável e capaz de mudança, os professores podem adotar métodos de ensino mais dinâmicos e personalizados, que podem incluir a incorporação de atividades que estimulem diferentes áreas do cérebro, como o uso de multimídia, exercícios físicos, música e artes. A variedade de estímulos ajuda a engajar diferentes vias neurais, facilitando a aprendizagem e a retenção de informações. Dessa forma, a neuroplasticidade explica a capacidade contínua de aprendizado humano, bem como orienta práticas educativas que potencializam essa capacidade.

Referências:


Glaucio Aranha – Professor adjunto no Instituto NUTES de Educação em Ciências e Saúde (NUTES), da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Atua como pesquisador-líder do grupo de pesquisa Tecnologias, Artes, Ciência e Saúde (TACS) e como colíder, em parceria com o Prof. Dr. Alfred Sholl-Franco (IBCCF/UFRJ), do grupo de pesquisa Neuroeduc – Neurociências Aplicadas à Educação (OCC/UFRJ). Coordena o projeto de extensão Redeneuro: rede de estudos em neuroeducação. Pesquisador associado do programa Núcleo de Divulgação Científica e Ensino de Neurociências, da UFRJ (NuDCEN/IBCCF/UFRJ)

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